Nos últimos tempos tem-se tornado muito comum ouvir-se que vivemos por ciclos. Que vivemos em ciclos políticos, ciclos económicos, e ciclos que nos conduzem a uma certa inevitabilidade na repetição da história. Há, de facto, leis universais que nos fazem andar às voltas: a rotação da Terra, o ciclo da água, as estações que se sucedem, a transição entre vida e morte. Nesta 11.ª edição do Festival Vaudeville Rendez-Vous, quisemos construir uma programação que em certa medida refletisse sobre a ideia de ciclo, num festival que inicia agora uma nova década. Mas não se engane, não se trata de andarmos às voltas. Tão pouco de andar para trás. Seremos como os répteis que renovam a pele. Também nós mudamos de pele, com uma nova identidade gráfica desenhada por Luísa Martelo, que nos acompanhará neste novo ciclo. E por falar em ciclos, daqueles que nos fazem avançar, abrimos o Festival com o espetáculo LA BANDE A TYREX, que nos traz um bailado ciclista, musical e rodopiante. A essa energia de movimento soma-se também RIPPLE, da companhia belga e neerlandesa TeaTime Company, onde uma espiral metálica em constante rotação gera um jogo físico e coreográfico de causa e efeito, lembrando-nos que nenhum gesto é neutro — cada ação desencadeia ondas, reverbera no corpo e no espaço, e inscreve-se no tempo. Quando pensamos em ciclos, a morte surge inevitavelmente como uma presença a convocar. Não como fim, mas como transição. Em MASACRADE, da companhia francesa Marcel et Ses Drôles de Femmes, a morte entra em cena com humor negro, acrobacia e absurdo, numa coreografia onde se ensaiam formas de morrer para melhor viver. Em HOMENAJE, da artista catalã Sílvia Capell, a morte é o instante imóvel que permite a celebração do que foi, através de uma natureza morta que ganha pulso e verticalidade no corpo da intérprete. Ambos os espetáculos enfrentam a morte com lucidez e poesia, incorporando-a como parte do movimento cíclico que é estar vivo. Interessou-nos também convocar artistas que trabalham a memória e a tradição não como arquivos imóveis, mas como territórios vivos em constante renovação. Em NKAMA, Dimas Tivane parte da sua herança moçambicana — da língua Changana à presença constante da música e da dança no quotidiano — para criar uma linguagem cénica onde o malabarismo se transforma em partitura rítmica. Em MELIC, a companhia IF Circus recupera o gesto ancestral do tricot como metáfora para a transmissão de saberes e vínculos afetivos entre gerações, reconfigurando o espaço cénico como lugar de cuidado e escuta. Já em TANCARVILLE, o coletivo Le G. Bistaki faz do lençol um dispositivo poético que contém, convoca e distorce o tempo, ligando o mais íntimo dos rituais à memória coletiva. Entre a memória e a invenção, a tradição e a ruptura, afirmamos o ciclo como impulso criativo, como convite à escuta, à abertura e à reinvenção. Que este novo ciclo nos encontre prontos para rodopiar — juntos — por mais uma volta.
julho
16 jul. • 14h30
Largo Dr. Martins Lima
Preço
Município de Barcelos - Theatro Gil Vicente
Promotor
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